Opinião – Todos Somos Seca

Viajo no Ribatejo com temperaturas acima dos 35 graus em pleno agosto.
Há pivots gigantes a regar milho às três da tarde. No mesmo instante, na rádio passa um spot que apela à contenção no uso da água e pedem-me que feche a torneira enquanto esfrego os dentes.
Vou continuar a fazê-lo.
E vou encher o balde enquanto a água aquece na cabine de duche.
Continuarei a usar a descarga mínima no autoclismo.
Faço-o consciente de que a água que eu posso poupar é uma gota no oceano de desperdício.
A agricultura consome mais de 70% da água captada. E em tempo de seca extrema, continuamos a produzir milho e arroz como no tempo das vacas gordas. Com a conivência das entidades a quem compete regular o bom uso da água que, tal como o sol, quando nasce é de todos.
Não pensem que os agricultores são os únicos maus da fita. Nós consumidores e gestores dos nossos consumos também ficamos mal neste filme trágico.
Em média, cada português gasta 186 litros de água por dia. Estudos recentes revelam que podemos reduzir a média para 120 l/ dia sem grande sacrifício.
Continuamos a gastar muito mais que o estritamente necessário e só nos lembramos quando chega a fatura.
Achamos que numa família de quatro pessoas, 30 euros de fatura com água, saneamento e recolha e tratamento de resíduos sólidos (lixo) é um exagero mas pagamos sem bufar 50 euros pelo pacote de TV, Net e telefone fixo.
Só valorizamos a água quando abrimos a torneira e não cai pingo. Nesse instante percebemos que o valor da água é muito superior ao preço.
O combate ao desperdício deve ser um compromisso de todos.
É imperioso continuar a investir na requalificação das captações e dos sistemas de abastecimento com substituição de redes e equipamentos.
Intensificar o combate aos furtos de água e ao uso abusivo de água tratada para encher piscinas, regar ou lavar pavimentos.
Neste nosso Ribatejo, as perdas de água são superiores a 30% em média. Ou seja, da água captada e tratada com custos significativos, um terço não chega a passar nos contadores instalados. Não é faturada.
E quem paga esta água.
Todos nós, clientes das entidades gestoras. Sejam domésticos, comerciais, industriais, instituições ou autarquias.
Em Portugal desperdiçamos 194 milhões de metros cúbicos de água/ano.
Daria para abastecer mais de dois milhões de habitantes.
Um verdadeiro oceano de desperdício num tempo e num planeta onde cada gota conta.
Opinião – Nelson Lopes – Jornalista desde 1990. Gestor de Comunicação